2009/09/19

Ad Infinitum

Demorei, mas voltei. Finalmente escrevi este texto. Veio meio sem querer, mas mesmo assim não consegui evitar. Além disso já deveria estar dormindo e estou com muita fome. Todavia, não podia fazer a idéia esperar mais. Se não acharem mais que uma perda de tempo, a culpa é da idéia, não minha. ;)

Oi. Meu nome é... bom, não importa. O que importa é que eu existo. Você deve estar se perguntando "Como assim, essa coisa que um mané escreveu me dizendo isso!". E se você for um pouco mais inteligente - ou desligado, ou sínico - deve estar pensando "Onde será que ele quer chegar?", não eu, mas o autor. Mas não pense nisso, seja mais inteligente, como no caso da primeira alternativa, pois o importante aqui sou eu. Sou eu. Eu SOU.

Você consegue me imaginar? Eu sou tão flexível quanto sua imaginação e mais a de um potencial infinito de próximos leitores. Assumo forma e mudo tão logo é determinado pela mente-ambiente. Mas não sou passivo. Quer ver só?

Eu estava caminhando por uma rua estreita numa noite fria, quando de um beco escuro soa um ruído estranho. Parei. Tremi."A Morte deve ter tropeçado enquanto expelia o que o fígado não conseguiu suportar da noitada." Senti meus joelhos trêmulos sobre meus pés húmidos, de suor ou de água suja duma poça, presente da chuva esporádica do verão no Planalto Central.
Quando dei por mim, estava voltando pelo caminho que me levou ali, num passo apressado, agoniado pelo desconforto da ideia de estar me afastando do caminho de casa, da chegada, sentindo-me seguido por um espectro sem cheiro nem ruído, ser cor nem peso, sua presença pesando nas minhas costas sua mão. Será que minhas panturrilhas vão agüentar, será que vou cair? Devo correr? Vou ter cãibras amanhã? Ele está aqui, está me alcançando; vou ver pelo menos seu rosto, se tiver coragem de abrir os olhos. Abri.
Acho melhor procurar um edredom, está frio; dormir com frio sempre me dá pesadelos.

Isso aconteceu. Quando? Acabou de acontecer: na minha mente, quando eu sonhei na sua. Na sua mente eu crio, cada vez que uma idéia faz sentido, por menor que seja, ela existe, na sua mente. E não foi você, não, com todo o respeito, você só forneceu o material, quem desenhou o beco fui eu, com suas cores, com seus tijolos, ou cerca, talvez um cachorro deitado no canto, à espreita por um portão - e fiz de novo. Se eu quisesse, teriam as cores e formas que eu determinasse, mas não vamos gastar tanto tempo com uma mera demonstração do meu poder criador.

Aqui na sua mente há muito pouca distância entre potência e ato, entre querer que exista e existir de fato. Quando quero que se formem árvores, elas estão presentes, o material nunca acaba, só depende da riqueza do mundo-mente em que me encontro. Se eu tropeço numa lata, você até ouve o barulho. Eu existo e crio.
Você acha pouco? "É só um pouco de nada, umas letras organizadas por um ocioso." Pois eu existo mais do que você! Com mais cores e por mais tempo. Fui concebido numa mente humana, não menos humana nem mais que eu; devagar, com tempo, mais tempo de gestação do que o esperado, mas vim de surpresa, enquanto o escritor conciliava sua organização de idéias com sua vontade de jogar no computador, mas eu fui mais forte, vim. Nasci aos poucos, escrito e apagado e reescrito, melhorado dentro das limitações de quem o fazia - melhor do que você, que é desse jeito, sem jeito. Sua mãe não tinha backspace?

Cá estou eu, e estarei novamente, toda vez que alguém ler este texto, para sempre ou para nunca, mas deixando uma marca - pequena e efêmera, talvez; talvez não - em todos os mundos que percorrer, como outros que existem da mesma forma que eu. E talvez, só talvez, se você tiver muita sorte, você também não exista, e aí também você poderá viver tanto quanto eu.

Tem mais coisa no forno. Perdi muito com uma infeliz tentativa de restauração de sistema, então terei de começar de novo. Mas por hoje é só.